Era uma vez uma aldeia muito pequena, que
se chamava Duas Pedras. Era tão pequena, tão pequena, que as pessoas que lá
viviam não precisavam de telefones para falarem entre si. Simplesmente se assomavam
à janela e falavam em voz alta.
Bom, isto não é completamente verdade.
Estou a exagerar um bocadinho. Mas a aldeia era muito pequena mesmo e todos se
conheciam entre si, e todos se ajudavam quando havia necesidade e eram mais ou
menos amigos. Por isso, as pessoas que viviam em Duas Pedras eram quase sempre
alegres.
Duas Pedras não era uma aldeia rica, mas
produzia quase tudo o que as pessoas precisavam. As pessoas tinham quintas, umas
pequenas, outras menores ainda, onde trabalhavam a terra, e também tinham
animais. Não havia grandes ruas, nem muitos carros e o ar era limpo. Assim, as
pessoas raramente ficavam doentes.
A quinta mais bonita de Duas Pedras era, sem
dúvida alguma, a quinta da dona Elvira. Chamava-se «Quinta Alegria» e era uma
quinta muito alegre mesmo. Não era muito grande, mas era bem organizada. A dona
Elvira tinha vinhas, que davam um vinho tinto que sabia a cerezas, cultivava
alfaces, tomates, batatas, cebolas, cenouras, tudo o que é preciso para cozinhar,
e também tinha animais: uma vaca, tres ovelhas, muitas galinhas, um galo, um suíno,
um cão e uma gata. Tinha também um papagaio azul, que um sobrinho seu, que era
capitão de um barco enorme como dez baleias juntas, lhe tinha trazido do Brazil.
Chamava-se Iguazú. O sobrinho chamava-se Pedro.
Na parte da frente da quinta havia também
uma casa pequena, a casa da dona Elvira. Tinha dois quartos, uma cozinha, uma
casa de banho e um pequeno salão. Tinha seis janelas, duas na frente, duas na
parte traseira e uma en cada um dos lados, e todas as janelas tinham cortinas
de renda. Tinha também uma porta, pois é preciso para entrar ou sair.
Na varanda havia um baloiço e muitos vasos
com flores. Todas as tardes do Verão, a dona Elvira sentava no baloiço e
tricotava, baloiçando e escutando música da rádio velha que tinha. Mais tarde,
quando já a luz se diminuia, ela deixava o tricô e ficava a olhar o pôr do sol,
cheirando o perfume das flores do seu jardim tão lindo!
Mas não vão pensar que os animais não
tinham onde dormir. Eles também tinham uma casinha, que os protegia do frio e
da chuva. E, para dizer a verdade, a casinha dos animais era maior do que a
casa da dona Elvira. Porém, a casa dos animais não tinha móveis, nem varanda,
nem baloiço. Isto estava bem, acho eu, porque nenhum dos animais sabia
tricotar.
Dentro da casa dos animais, cada animal
tinha o seu posto. A vaca e as ovelhas eram vizinhas, dormiam perto. Numa parte
separada, com saída separada, dormia o suíno, e num canto havia a capoeira,
onde, sobre paus pegados na parede, dormiam as galinhas em linha, como os
pratos numa prateleira. A capoeira tinha também saída separada, mas aquela
saída era muito pequena, só para ser usada pelas galinhas.
A dona Elvira ia à casa dos animais todos
os dias, porque tinha de dar aos animais de comer. Também, recolhia os ovos que
as galinhas punham, ovos brancos ou mais coloridos, que muitas vezes eram ainda
quentes, mantendo o calor do corpo das galinhas. E, mais importante ainda,
ordenhava as ovelhas e a vaca. Com o leite, depois, fazia um queijo branco,
levemente amarelo, outras vezes macio, outras vezes mais duro, aromatizado com
várias ervas. O queijo, junto ao vinho, eram os produtos mais famosos da
quinta.
A «Quinta Alegria» era uma quinta
arrumada, porque a proprietária era muito organizada e muito trabalhadora.
Quando a dona Elvira era muito jovem, fazia tudo quase sozinha, e digo quase
sozinha porque havia também o marido dela, o Amilcar, que era também muito
trabalhador. Mas, um dia o Amilcar morreu, e a dona Elvira ficou sozinha com a
quinta.
Ela continuou a trabalhar como dantes, e
seguiu trabalhando durante muitos anos, mas o trabalho ficava cada vez mais
difícil. Aliás, enquanto a quinta ficava a mesma, a dona Elvira crescia e
crescia... Já tinha cincuenta e cinco anos e continuava a crescer. Cincuenta e
cinco anos, meu Deus, isto é muito! Claro, se pensarmos que a Rute, a tartaruga
mais inteligente das ilhas Galapagos, tem oitenta anos, cincuenta e cinco não
parece muito, mas mesmo assim... Cincuenta e cinco é igual a onze vezes cinco,
é como uma equipa inteira de futebol com jogadores de cinco anos!
A dona Elvira, então, acordou um dia
sentindo tão cansada que decidiu ficar na cama. O Riqui, o galo da quinta,
anunciou todas as horas da manhã como um bom relógio suíço, mas a dona Elvira
não saíu. Sentia-se tão fraca naquele dia! Mas os animais tinham de comer. Não
podia continuar assim. Era hora de fazer algo.
O Iguazú estava na cozinha, silvando e
dizendo «Oi, gentsi! Ta legau?» «Oi! Ta?», como todos os dias, e a dona Elvira
levantou-se da cama para ir dar-lhe de comer. Abriu a caixa da comida, o Iguazú
sacudíu as asas dizendo «Bacana!», e foi então quando ela teve a ideia: ia
contratar um empregado!
Assim foi como o Vitorino começou a
trabalhar na Quinta Alegria. O Vitorino trabalhava também na quinta do seu pai,
mas como eram três irmãos e a quinta era pequena, não havia bastante trabalho
para todos. Ele encarregou-se das vinhas e do resto das cultivações, enquanto a
dona Elvira limitou-se a cuidar os animais, o jardim e a casa. Todos ficaram
contentes. Mas a nossa história ainda não começou.
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